
 Há 20 anos, às 6h53 do dia 2 de maio de 1997, 
morria no hospital Albert Einstein, em São Paulo, o patrono da educação brasileira Paulo Freire, aos 75 anos.
Internado
 um dia antes para tratamento de uma angina –dor no peito causada pela 
falta de oxigenação no músculo do coração–, Freire foi vítima de um 
infarto agudo do miocárdio.
O corpo do educador foi velado no Tuca, o
 teatro da PUC de São Paulo (Pontifícia Universidade Católica), 
instituição que em 1979 o acolhera como professor quando retornou ao 
Brasil após 16 anos de exílio motivado pelo golpe militar de 1964. 
Freire foi sepultado no Cemitério da Paz, no Morumbi, zona sul de São 
Paulo. 

                                                   Paulo Freire após o retorno do exílio, em 1979 (Foto: ago.1979/Folhapress)
ORIGENS
Paulo
 Freire nasceu Paulo Reglus Neves Freire, em 19 de setembro de 1921, no 
bairro da Casa Amarela, no Recife, capital de Pernambuco. Filho do 
policial militar e espírita Joaquim Temístocles Freire –que morreu 
quando Freire tinha 13 anos– e da católica Edeltrudes Neves Freire, o 
caçula de quatro irmãos foi alfabetizado pela professora Eunice 
Vasconcelos, a qual lembrava em algumas entrevistas.
Aos oito anos, 
com a crise de 1929, mudou-se com a família para a cidade de Jaboatão 
dos Guararapes, a 18 km do Recife. O primeiro ano ginasial foi concluído
 com atraso, quando tinha 16 anos. Estudou como bolsista no colégio 
Oswaldo Cruz, onde mais tarde daria aulas de língua portuguesa.
Em 
1941, aos 22, entrou para a Faculdade de Direito do Recife, mas não 
chegou a exercer a profissão. Nessa época Paulo Freire já era 
influenciado por Ernesto Carneiro Ribeiro, Ruy Barbosa e Karl Marx.
Três
 anos depois, em 1944, casou-se com a professora primária Elza Maria 
Costa Oliveira, com quem teve cinco filhos, numa união que durou 42 
anos, até a morte dela em 1986. Elza foi uma de suas principais 
inspirações em sua trajetória como educador. Dois anos mais tarde, após 
um período de depressão, casou-se com a também educadora Ana Maria de 
Araújo Freire, a Anita Freire.Morumbi, na zona sul de São Paulo.

     O secretário municipal da Educação Paulo Freire e a prefeita Luíza 
Erundina em evento em São Paulo, em 1990                       (Foto: 
990/Folhapress)
O EDUCADOR E SEU MÉTODO LIBERTADOR DE ENSINO
Entre
 1947 e 1954, Paulo Freire atuou como diretor de educação e cultura no 
Sesi (Serviço Social da Indústria), recém-criado no país. Em 1956, ele e
 outros oito educadores pernambucanos foram nomeados membros do Conselho
 Consultivo de Educação do Recife.
Em 1959, formou-se doutor em 
filosofia e história pela Universidade do Recife, onde mais tarde 
atuaria como professor e um dos fundadores do Serviço de Extensão 
Cultural da Universidade. Em 1961, foi nomeado diretor da Divisão de 
Cultura da Secretaria Municipal de Educação. Foi um dos fundadores do 
Movimento de Cultura Popular do Recife.
Nesse período, elaborou uma nova e revolucionária filosofia de alfabetização, que mais tarde ficaria conhecida como 
Método Paulo Freire,
 que tinha como proposta atrelar o aprendizado da escrita e da leitura 
das camadas mais pobres à conscientização quanto às suas condições de 
submissão e passividade diante do mundo. Era uma forma de despertar no 
oprimido o seu real valor perante a sociedade opressora, ideia ligada ao
 pensamento dialético de Karl Marx e até hoje contestada por parte dos 
especialistas em educação.
A primeira grande experimentação do 
projeto foi implementada em 1962, na cidade de Angicos, no Estado do Rio
 Grande do Norte, onde Paulo Freire conseguiu alfabetizar 300 
trabalhadores em apenas 45 dias.
O êxito do plano rendeu ao 
intelectual o convite do ministro da Educação do governo Jango, Paulo de
 Tarso Santos, para que Freire coordenasse o Programa Nacional de 
Alfabetização, colocado em prática no início de 1964. Com a chegada do 
golpe militar, no entanto, o programa foi extinto pelo novo governo. O 
método chegou a ser aplicado em regiões dos EUA e da Europa.

Como
 secretário municipal da Educação, Paulo Freire faz visita em escola na 
Vila Mariana, na zona Oeste de São Paulo (Foto: 15.dez.1989 – Matuiti 
Mayezo/Folhapress)
O SUBVERSIVO
Considerado subversivo pelo regime
 autoritário, Freire ficou preso cerca de dois meses até ser exilado. 
Primeiro, foi para La Paz (Bolívia), mas, devido ao golpe ocorrido 
naquele país, o educador passou a morar no Chile, onde trabalhou durante
 cinco anos no Instituto Chileno para a Reforma Agrária (ICIRA). Nesse 
intervalo lançou uma de suas principais obras, “Pedagogia dos Oprimidos”
 (1968), traduzida em mais de 20 línguas e lançada no Brasil apenas em 
1974 por razões políticas.
Em 1969, foi convidado para ser professor 
visitante na Universidade de Harvard (EUA), onde apresentou suas 
reflexões sobre alfabetização. No ano seguinte, foi para Genebra 
(Suíça), onde atuou como consultor do Conselho Mundial das Igrejas. 
Desde então passou também a trabalhar como consultor educacional em 
países subdesenvolvidos, em sua maioria nações africanas, como 
Guiné-Bissau, Cabo Verde, Angola, Moçambique, e também em países da Ásia
 e América Latina. 

Paulo Freire em seu retorno ao Brasil após 16 anos no exílio (Foto: ago.1979/Folhapress)
A VOLTA E A VIDA PÚBLICA 
Em
 1979, com a Lei da Anistia, Paulo Freire retornou ao Brasil depois de 
16 anos de exílio, mas a volta definitiva se deu no ano seguinte, em 
1980, quando foi convidado a lecionar na PUC e na Unicamp. No mesmo ano 
filiou-se ao recém-fundado Partido dos Trabalhadores (PT).
Ainda em 1980, é 
agraciado
 com o Prêmio Internacional Rei Balduino para o Desenvolvimento do 
Terceiro Mundo, em Bruxelas, na Bélgica. Seis anos depois, em 1986,  
Freire recebe o prêmio Educação pela Paz, da Unesco (Organização das 
Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).
Em 1989, 
tornou-se secretário de educação municipal da prefeita Luiza Erundina em
 São Paulo, cargo que ocupou até maio de 1991, quando foi 
substituído
 pelo amigo e professor Mário Sérgio Cortella, então chefe de gabinete 
da secretaria. Divergências com o PT e a retomada a atividades 
acadêmicas motivaram sua saída do cargo. No mesmo ano foi fundado o 
Instituto Paulo Freire. O educador teve pelo menos outros 26 centros 
educacionais com o seu nome pelo mundo.
No ano de sua morte, em 1997,
 Paulo Freire escrevia o terceiro capítulo do livro, “Cartas 
Pedagógicas”, onde analisa a banalização da violência como resultado de 
uma educação precária. Foram quase 40 obras ao longo da vida. No dia de 
sua morte, receberia da Universidade de Havana, em Cuba, o seu 36° 
título de doutor honoris causa. Paulo Freire foi o intelectual 
brasileiro com o maior número de títulos recebidos em várias 
universidades por todo o mundo e um dos mais premiados na área da 
educação.
Paulo Freire em seu primeiro ano como secretário Municipal da Educação 
da prefeita Luíza Erundina, em 1989 (Foto: Carlos Goldgrub – 
28.out.1989/Folhapress)
Nos últimos anos, críticas a seu método de 
alfabetização têm sido debatidas por movimentos de direita, entre eles o
 “Escola sem Partido”, que caracteriza sua filosofia como 
doutrinária e marxista.
Em maio de 1994, em 
entrevista
 à Folha, quando questionado sobre o porquê de seu método não ter sido 
eficaz na erradicação do analfabetismo no Brasil, disse se tratar de 
“decisão política”, pois, segundo ele, “para a classe dominante, 
reconhecer os direitos fundamentais das classes populares, não é fácil”.
FRASES
“Descobri
 que o analfabetismo era uma castração dos homens e das mulheres, uma 
proibição que a sociedade organizada impunha às classes populares.” – 
29.mai.1994
“O Mobral (Movimento Brasileiro de Alfabetização, 
implantado no regime militar) nasceu para negar meu método, para 
silenciar meu discurso.” – idem
“Eu não aceito que a ética do 
mercado, que é profundamente malvada, perversa, a ética da venda, do 
lucro, seja a que satisfaz o ser humano.” – 31.mar.1997
“Os negros no Brasil nascem proibidos de ser inteligentes.” – 1990