segunda-feira, 29 de junho de 2020

UMA RÁPIDA ANÁLISE E REFLEXÃO SOBRE OS RUMOS DO PISF (PROGRAMA DE INETEGRAÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO).


Começo afirmando que a água é um direito humano inalienável! E garantir acesso à água potável para o consumo humano deveria ser prioridade de qualquer governante, em particular, no semiárido brasileiro, onde as injustiças e desigualdades sociais e de renda são gigantescas, não por causa direta da seca, mas, em decorrência do modelo de produção e consumo vigente do Brasil. 



O fenômeno físico e natural da seca em nosso semiárido, nos últimos 07 anos, tem causado em grande parte das cidades e comunidades rurais o colapso de abastecimento ou processo de intenso racionamento no uso da água. A irregularidade climática provocou, nos agricultores familiares, grandes limitações para a produção de alimentos para o consumo humano e animal e reduziu as possibilidades de trabalho e renda, aumentando ainda mais o fosso social. 



Além dos efeitos da seca, a região tem sido afetada, historicamente, pela concentração de riqueza e pela ausência de políticas públicas sociais, econômicas e de recursos hídricos, estruturantes e permanentes. A falta de cuidados com o meio ambiente e a má gestão dos recursos hídricos também são fatores que vêm afetando o semiárido, porém, a escassez é um fato, somada à necessidade dos usos múltiplos da água. 



Em qualquer lugar e, especialmente, no semiárido o direito a um meio ambiente saudável e o direito à água estão intrinsecamente ligados e são direitos humanos que devem ser garantidos pelo Estado, por meio de políticas econômicas, sociais, hidroambientais e culturais, tais como ratificados na Constituição Federal de 1988, sendo incompatível tratar esses direitos como favor, negócio ou mercadoria.



É dentro deste quadro, de uma histórica desigualdade ambiental, social, hídrica e econômica, que o PISF deve se colocar com suas estratégias de ação e democratização das águas do eixo norte para atender ao direito humano de acesso à água.



O Programa de Integração do São Francisco(PISF) é uma obra estrutural e física, que contribuirá para aumentar a segurança hídrica dos estados do PE, PB , CE e RN, porém, se faz necessária uma visão de desenvolvimento territorial com integração de políticas públicas e em sinergia com as capacidades, oportunidades e potencialidades da região, capazes de promover ações estruturantes que coloquem em marcha a inclusão social e produtiva, com geração e distribuição de renda, superando a implementação de políticas emergenciais e compensatórias.



Diante de toda polemica que envolve o PISF, o fato concreto é que essa obra está em fase de conclusão e seu custo total, incluindo os ramais e revitalização da bacia doadora e receptora, será elevadíssimo, em torno de 20 bilhões de reais e terá um custo também elevadíssimo de operação, manutenção e fiscalização para os governos e a sociedade. A principal pendência, além de alguns serviços de obras físicas que ainda faltam, é a gestão, por meio da assinatura de contrato entre a Operadora Federal do projeto, a CODEVASF, e as operadoras estaduais. Com a assinatura do contrato, terá início a prestação do serviço e a correspondente cobrança de tarifas referentes à água disponibilizada e à água consumida. É bom lembrar que esse contrato define obrigações da União e Estados, visando garantir a sustentabilidade financeira e operacional do PISF.



Em resumo, o PISF se propõe a garantir a segurança hídrica de 12 milhões de habitantes, em 390 municípios de PE, CE, PB, RN e beneficiar 294 comunidades rurais às margens dos canais. Tem dois Eixos (477 Km): Norte com 260 km e Leste com 217 km. São 9 EBs, 27 reservatórios, 4 túneis, 13 aquedutos, 9 subestações de 69 Kv a 230 kV, e 270 km de linhas de transmissão. Está previsto o abastecimento de água de grandes centros como: Fortaleza (CE), Juazeiro do Norte (CE), Campina Grande (PB), Mossoró (RN), Caruaru (PE) e João Pessoa (PB) e mais de centenas de cidades do Semiárido.



No Eixo Norte, as obras do Projeto de Integração do Rio São Francisco passam pelos seguintes municípios: Cabrobó, Salgueiro, Terranova e Verdejante, em Pernambuco; Penaforte, Jati, Brejo Santo, Mauriti e Barro, no Ceará; São José de Piranhas, Monte Horebe e Cajazeiras, na Paraíba. Já no Eixo Leste, o empreendimento atravessa os municípios pernambucanos de Floresta, Custódia, Betânia e Sertânia; e a cidade paraibana de Monteiro.



A outorga da ANA para o PISF prevê que podem ser bombeados até 26,4 m3/s, correspondendo à demanda projetada para o ano de 2025, para consumo humano e dessedentação animal, a qualquer tempo, e 127,0 m3/s quando o reservatório de Sobradinho estiver em um estado hidrológico satisfatório. 



Como todos sabem, as ideias de integração do velho Chico iniciou em 1847 por meio do Deputado Provincial do Ceará(Crato), Marco Antônio de Macedo. Ele imaginou a primeira transposição das águas do São Francisco para o riacho dos Porcos no Ceará (afluente do Jaguaribe) numa extensão de 200 km, porém, as obras físicas propriamente ditas, do PISF para o nordeste setentrional, só foram iniciadas em 2007 no governo de Lula. Passou pelo governo Dilma, quando esse eixo norte ficou com 94,96% das obras concluídas. Nos governos Temer e Bolsonaro o eixo norte atingiu o percentual de 97% de sua conclusão. Já o eixo Leste ficou com 97,7% das obras concluída, no governo Dilma, sendo finalizado no governo Temer. O trecho do eixo norte, recentemente inaugurado pelo presidente Bolsonaro, permitirá o enchimento do reservatório Jati (no Ceará) e daí possibilitará que as águas sigam para os estados da PB e RN até o final de 2021, isso se os investimentos continuarem, afinal de contas, só faltam 3% para concluir as obras desse trecho. 



O PISF eixo Norte, para ser concluído em sua plenitude e cumprir minimamente com seus objetivos de garantir justiça hídrica, social, ambiental e econômica, deverá minimamente cumprir pelo menos as seguintes demandas na bacia hidrográfica dos rios Piancó-Piranhas –Açu:

A) Revitalização de todos os rios da bacia receptora das águas do PISF, que se encontram gravemente assoreados, com recuperação de suas matas ciliares, dos rios tributários e suas nascentes; 

B) Conclusão da obra física e social da barragem de Oiticica até dezembro de 2021 que custará em torno de 700 milhões de reais;

C) Implantação do projeto sistema adutor do Seridó a partir da barragem de Oiticica/PISF, até 2022, para atender 300 milhões de pessoas no Seridó do RN, o qual custará 300 milhões de reais;

D) Implantação, urgente, do consórcio de resíduos sólidos do Seridó e recuperação ambiental do local onde se encontra o lixão de Caicó, entre os rios Sabugi e Seridó, bem como, todos os demais locais onde se encontram os lixões dos outros municípios;

E) Que os municípios da bacia receptora do PISF elaborem seus planos e implementem de imediato a política de saneamento básico, em conformidade com a Lei nº 11.445/07. Essa ausência de saneamento básico é uma agressão e violência contra o meio ambiente e o ser humano; 

F) Garantia de recursos financeiro no orçamento da União para a implantação dos ramais do Piancó(PB) e Apodi(RN);

G) Que as águas do projeto de integração do São Francisco eixo norte sejam prioritariamente para o consumo humano e dessedentação animal e, em caso de excedente, que seu uso seja garantido para a produção de alimentos saudáveis, de base agroecológica, nos assentamentos e comunidades da agricultura familiar, ao longo dos rios, perímetros do DNOCS e entorno dos açudes;



Concluindo essa rápida reflexão sobre o PISF, digo, com profunda indignação, adeus à água como Bem Comum. O Congresso Nacional acaba de aprovar, e aguarda a sanção presidencial, o Projeto de Lei 4162, que privatiza os serviços de água e esgotamento sanitário no país. Vai levar ao desmonte das companhias públicas que garantem saneamento à população, aplicando o princípio da solidariedade, o chamado subsídio cruzado: o que arrecada a mais numa região custeia os serviços onde a arrecadação é deficitária. A privatização acaba com a solidariedade e expõe a voracidade do setor privado pelo lucro. O lucro vai estar acima da vida. Equiparar a água a uma mercadoria é transformar a vida em um objeto, pois a água é uma necessidade intrínseca à existência da vida. 




Por fim, entendo que quem tem sede, tem pressa e pressa de direito! Que seja concluído imediatamente o eixo norte do PISF! Água não é favor, nem mercadoria, muito menos voto! É direito, um direito humano inalienável!



Engenheiro Agrônomo José Procópio de Lucena

Articulador do Seapac/ membro do Comitê da Bacia Hidrográfica dos rios Piancó-Piranhas-Açu!

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