O Brasil precisa entrar numa rota de crescimento sustentável. E para que seja efetiva a reforma tributária em análise no Congresso Nacional deve adotar um modelo que assegure investimentos para o setor público, garanta o destrave do crescimento econômico e permita a criação de um ambiente de negócios favorável e seguro. Essa é a sugestão do presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney Menezes Ferreira, apresentada nesta quinta-feira (27) à Comissão Mista da Reforma Tributária, que se reuniu remotamente para ouvir representantes do setor produtivo.
Em nome do setor financeiro, Isaac Ferreira lembrou que a reforma tributária tem sido discutida há cerca de 30 anos e considerou que o país está maduro do ponto de vista institucional para definir a questão. Para ele, o novo texto deve levar em conta princípios como o da neutralidade, da redução gradativa de tributos e da simplicidade. E todas as decisões relacionadas a produção, consumo e investimentos, disse, devem passar a ser tomadas em função da lógica econômica, de modo a eliminar as distorções do sistema atual.
— É fundamental não haver aumento da carga de tributos. O sistema deve permitir uma redução gradual da carga tributária atual e não deve interferir no funcionamento da economia, nem nas decisões dos agentes econômicos. É um tema que deve levar em conta também o princípio da simplicidade, garantindo ao contribuinte a compreensão do seu funcionamento, para que ele possa cumprir com suas obrigações sem incorrer em gastos excessivos, tanto de recursos humanos quanto financeiros.
Complexidade
Ex-ministro da Previdência, o representante da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Roberto Brant, observou que o sistema tributário nacional é complexo e oneroso. Segundo ele, o governo precisou recorrer a uma série de improvisações para acomodar o aumento das despesas até chegar ao limite atual. Apesar de concordar com a necessidade de o Brasil rever seu sistema tributário, Brant demonstrou preocupação com o fato de o assunto estar sendo discutido no momento de crise provocada pela pandemia de coronavírus, que, segundo afirmou, ajudou a aprofundar a recessão econômica no país.
Brant ponderou que não são neutras as propostas em tramitação — as propostas de emenda à Constituição (PEC 45/2019), na Câmara , e (PEC 110/2019), no Senado, e o projeto de lei apresentado pelo governo federal (PL 3.887/2020). Para ele, essas proposições representam grande transferência de carga de tributos, que deverá incidir principalmente sobre os setores rural e de serviços.
— Não posso deixar de expressar nossa inquietação com o fato de que vivemos uma séria crise e uma economia mergulhada numa grave recessão e tenhamos de tratar de uma reforma tão ampla no âmbito do Estado. Temos de raciocinar que a alíquota prevista vai girar em torno de 30%. Será a mais alta alíquota de imposto de valor agregado em todo o mundo. Autoridades que vivem o dia a dia do sistema tributário acham mesmo que vai acabar ficando inviável.
Sobrevivência
O economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), Fabio Bentes, disse que uma empresa no Brasil gasta, em média, 1,5 mil horas por mês para honrar suas obrigações tributárias. E essa realidade, segundo afirmou, gera uma série de empecilhos aos investimentos e à retomada do crescimento econômico. Para o especialista, no entanto, o momento não é oportuno para a discussão da reforma tributária. Isso porque, na opinião de Bentes, a pandemia de covid-19 provocou uma crise sem precedentes, levando a economia brasileira a encolher cerca de 10% no segundo trimestre de 2020 e à previsão de fechamento do ano com queda desses índices em torno de 5%.
Bentes observou ainda que a discussão do tema se torna fragilizada pelo fato de o Congresso Nacional estar deliberando remotamente desde março, em decorrência das medidas de distanciamento social adotadas para combater a pandemia de coronavírus.
— Portanto, a gente entende que discussão neste momento se torna muito prejudicada. Uma matéria de tamanha complexidade não deveria ser analisada sem debates presenciais. Na realidade, deveríamos focar em garantir a sobrevivência das empresas. Recentemente, a Confederação Nacional do Comércio divulgou um balanço mostrando que 135 mil empreendimentos do comércio, com vínculos empregatícios, foram fechados no semestre. Então, eu acredito que, no momento atual, a gente deveria estar discutindo a sobrevivência das empresas no curto prazo — ressaltou.
Cooperativismo
O presidente da Confederação Nacional das Cooperativas (CNCoop), Márcio Lopes de Freitas, ressaltou a necessidade de tratamento tributário que se adeque à atividade cooperativa. Ele argumentou que não se trata de um pedido de vantagem, nem diferenciação, mas de justiça a ser prevista no novo texto. Ao reforçar a necessidade de simplificação dos tributos sobre o setor, Freitas observou que o cooperativismo é uma atividade econômica, prestadora de serviços, reconhecida na Constituição.
— É uma questão complexa, mas, para nós, é muito simples. Quando as cooperativas buscam o adequado tratamento tributário, elas buscam, na realidade, uma maior vantagem competitiva ou comparativa tributária, não é um processo diferenciado. É um tratamento justo, correto. Não há sentido em se tributar uma operação de pessoa jurídica chamada cooperativa, e o cooperado, dono desta cooperativa, que entregou sua mercadoria, seu serviço, sua energia ou seu recurso financeiro, pagar também. Não há sentido pagar tributo duplamente.
Seguros
Diretor da Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNSeg), Alexandre Leal ressaltou que a discussão sobre a reforma tributária tem causado instabilidade no setor. O debatedor demonstrou preocupação com trechos das propostas em tramitação no Congresso, como uma possível omissão da PEC 45 relacionada ao IOF, incidente sobre as operações. Leal também defendeu a simplificação, principalmente dos tributos referentes ao consumo, de modo a garantir uma tributação não cumulativa.
— A visão do setor é que dificilmente o legislador não estava querendo manter o seguro dentro desse imposto [IOF], mas, para evitar qualquer discussão futura, o nosso posicionamento e a nossa contribuição, foi que deixassem explícito que no segmento de seguros incidiria o IBS sobre essas operações. A ideia é que a tributação sobre o IOF, que hoje incide sobre as operações de seguro, caia. A PEC 45 é omissa em relação à questão. A PEC 110, sim, prevê que, ao longo do tempo, a alíquota do IOF vá caindo até ser zerada algum tempo depois da entrada em vigor do imposto. A nossa proposta, no âmbito da 45, é que efetivamente o seguro saísse do escopo do IOF.
Convergência
Esta foi a primeira audiência pública da comissão mista para ouvir representantes do setor privado. O relator, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), destacou a convergência de opiniões observada entre os especialistas. E concordou que a reforma deve ser planejada sob os pilares da simplificação, da equidade e da segurança jurídica, abrangendo as peculiaridades de cada setor.
— A nossa visão é justamente sobre a necessidade de simplificação, compreendendo e conversando com todos os segmentos, para não termos a intranquilidade dos produtores rurais. Estamos trabalhando e dialogando com todos para construir um texto que enxergue cada um com sua importância e buscando a neutralidade, sem resultar em peso para qualquer atividade — explicou.
Em diligência do governo federal no Maranhão, o presidente da comissão mista, senador Roberto Rocha (PSDB-MA), destacou o empenho dos parlamentares para cumprir o calendário de audiências públicas. Ele informou que na próxima semana será ouvido um segundo grupo de especialistas do setor privado. Na sequência está programada uma nova rodada de debates, com representantes de setores como o da tecnologia.
A previsão, segundo Roberto Rocha, é unificar os textos e consolidar uma proposta de reforma tributária a ser apresentada na primeira quinzena de outubro.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
Fonte: Agência Senado
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